quarta-feira, 8 de julho de 2015

Isto de ser adulta

Há dias, alguém me dizia  "não falei logo contigo para jogar padel, porque imaginei que, agora com uma filha, não pudesses fazer programas à noite". E não me importei nem pensei mais nisso (até hoje), porque a pessoa em questão não tem filhos e podia estar a dramatizar um pouco o que é isto de ter uma filha.

No último casamento que tive, comentava uma amiga minha (solteira) comigo: "agora não vos convido para jantar, porque imagino que tenham mais que fazer". Dei-lhe um raspanete pelo comentário e expliquei que continuávamos sempre disponíveis (e cheios de vontade!) para jantares e programas giros. Não pensei também mais no comentário (até hoje), porque pensei que poderia apenas ser uma desculpa (esfarrapada) para a falta de iniciativa para convites.

Só que ontem foi a minha própria mãe a dar a "facada" fatal e a atirar a gota que fez transbordar o copo. Comentava eu que andava com menos tempo para ir ao ginásio, quando a minha mãe respondeu, sem hesitar: "mas tu achas que eu conseguia ir ao ginásio contigo e com a tua irmã em casa? é normal, agora não tens tempo. és adulta". E fiquei a matutar naquilo. E a matutar. E a matutar.

Mas desde quando é que ser mãe implica que temos que "ser adultos" e abdicar de tudo o que nos faz feliz: jantares, ginásios, jogos com os amigos...? Faz tudo parte do pack "ser adulto responsável e caseiro"? Não, não me posso identificar com este estilo de vida. Adoro ser mãe. Não consigo estar um dia sem ver a minha filha. Morro de saudades se não a vejo à hora de almoço, por exemplo (sim, continuo a ir quase sempre a casa almoçar, só para a ver!). Mas nunca me pareceu incompatível o ser mãe com o ir correr no final do dia. Ou ir jantar com os amigos (e levá-la quase sempre connosco, se o sítio propicia - por que não?). Serei menos adulta por isso?

A verdade é que me sinto quase sempre uma criança numa pele de adulta. E posso receber um salário no final do mês. Posso pagar as contas da água e da luz. Posso até pagar à empregada. Levar a filha ao pediatra. Verificar se as vacinas estão em dia. Entregar a Declaração de IRS. Fazer contas. Levar o carro a lavar. Discutir poupanças e reformas. Mas, quando dá aquela música que gosto, continuo a querer dançar e fingir que toco guitarra sem pensar em mais nada. Continuo a gostar de devorar pacotes de bolachas no sofá, enquanto vejo algo lamechas. Continuo a gostar de cantar no chuveiro. Continuo a sentir o apelo, quando toco com os pés na areia molhada, para fazer a roda ou pino. Continuo a sentir vontade de pedir algodão doce nas feiras populares. Continuo a querer ir a festivais de música. Continuo a acreditar que ainda vou voltar a ter aulas de piano. Continuo a ver um baloiço e a ter andar. Continuo a ver Legos e a não resistir a criar logo alguma figura. Continuo a gostar de desenhar. Às tantas, um dia destes, tudo isto se vai tornar ridículo e nem me vou aperceber. Vou tornar-me uma velha sem noção da idade, a fazer figuras tristes que embaraçam o resto da família. Talvez. Mas enquanto a pele de adulta me estiver demasiado larga para a vestir, vou continuar a ser mãe e ser mulher da forma que sei fazer melhor. E da forma que me faz feliz. É única forma que sei ser.

7 comentários:

  1. Anónimo21:55

    Ainda bem. Que ainda assim é. Eu tenho 40 anos e quando penso em e me refiro a mim ( e me olho ao espelho!) vejo uma miúda! Pior mesmo é a tua mãe pensar que és uma adulta só agora que és mãe...?!

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  2. Anónimo10:16

    Isso é mt bonito, mas é cantado;)
    Se calhar por não estar preparada psicologicamente tb dizia que NADA ia mudar... e mudou TUDO!
    Não é por opção que passei de uma média 2x/ semana no cinema para 2x/ ano=o Infelizmente não temos avós que fiquem com os netos sempre que dá jeito... Os amigos e padrinhos vão dando a mão * * *
    Agora não se janta à hora que calha, 12h ao almoço no fds e 8h todos os dias ao jantar senão é uma sinfonia de sono misturado com fome;p Qualquer programa fora de casa tem que ser programado com 2horas de folga, não vá alguma coisa correr "mal"!
    Chamam-se prioridades... Não vejo a AP todos os dias ao almoço, por isso aproveito todos os minutos entre as 18h e as 21h30 para brincar com ela/ dar-lhe banho/ comermos juntos à mesa/ deita-la!
    Descobri que depois do jantar se pode fazer mil e uma coisas (uma vez que já não acabo de comer à meia noite)... Mas não inclui sair de casa durante a semana:p Pelo menos na minha companhia preferida, um dos dois fica sempre de "castigo".
    Quanto ao desporto, confesso que a preguiça me vence nos horários das 6h ou 22h... São escolhas:)
    Bj

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    1. Eu acho que nada substancial tem que mudar, a não ser os programas românticos a dois, que passam agora a ser a três. E claro, o cinema passa a ser em casa. Se se janta fora, pede-se um prato para a bebé (os restaurantes têm sempre sopa de legumes passada e outros pratos saudáveis). Se há vontade de ir correr, fica o pai em casa uma hora. Se vai o pai jogar futebol, fica a mãe com a bebé. Acredito que os hobbies se podem manter e os pais podem continuar a ter uma vida preenchida e feliz, sem se anularem, sendo em simultâneo pais sempre presentes.

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    2. Anónimo17:20

      Continuo a ter vida social. Mas é utópico dizer que nada muda porque passa tudo a ser programado em função daquela mini pessoa.
      E até me acho super relaxada, só estava a querer dizer que é difícil seres boa a tudo... Boa profissional, boa mulher, boa mãe, boa amiga... Às vezes esqueces-te de ti para seres boa para os outros;p
      Mas não é impossível! Mas não é fácil, mesmo cheia de vontade;)

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    3. Anónimo16:47

      Não percebo o que é que o comentário da 1ª Anónima tem a ver com o que a Pippa escreve. O que a Pippa diz é que, se ser adulta é não estar disponível para fazer o que se gosta, então ela continua a sentir-se jovem. Parece-me que a Anónima está demasiado preocupada em falar do seu dia-a-dia rotineiro e monótono e chamar-lhe "prioridades", como se alguém tivesse qualquer tipo de dúvida que um filho é sempre prioritário!
      Proposta: se o texto da Pippa é, e cito "bonito, mas é cantado", que se faça uma música com esta letra!:)
      Parabéns Pippa... és uma inspiração. IS

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  3. Não sou mãe por isso falo sem experiência própria :) Sem dúvida que será óptimo poder contar com ajuda e acredito que para algumas pessoas seja mais complicado conciliar tudo! Mas também me parece que tem muito a ver com descomplicar e ter um espírito relaxado! Há quem continue a ter uma vida social activa e eu tenho-te como exemplo mas por vezes fico com a sensação de que há pessoas que não podem ser confrontadas com esta verdade. Precisam de acreditar que não é possível para justificar outra verdade - que não conseguem... Um beijinho :*

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  4. Acho que a personalidade não tem que mudar e o rótulo 'adulto' é usado e abusado para nos colocar em situações em que a mudança de um determinado contexto (por exemplo, ter um filho) é utilizado como um espartilho que nunca mais tirar.

    O facto do tempo ser um bem cada vez mais precioso e a forma como temos de o gerir é que faz a diferença - podemos (e se tivermos ajuda, tudo se torna mais fácil) não deixar de ser crianças e tentar apanhar todos os minutos que nos permitam gozar isso mesmo, mas temos agora a noção de tempo e da partilha a que somos obrigados para que tudo 'bata certo' (ou pelo menos não bata errado).

    E isso, digo eu, não nos obriga a ser adultos, como se isso fosse um manto cinzento e austero, 'apenas' responsáveis.

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