terça-feira, 19 de maio de 2015

O efeito-escadas-rolantes

Gosto de observar os outros.

Lembro-me de ter uns 5 ou 6 anos e perder horas na praia, sentada na areia, a reparar nas pessoas que iam passando. O exercício passava por imaginar uma vida para cada pessoa. Se era casada ou solteira. Feliz ou tremendamente deprimida. Atribuía uma profissão em menos dum minuto. Desenhava toda uma personalidade, sonhos, aspirações... E criava ainda diálogos imaginários entre a pessoa e quem a rodeava. Até hoje tenho a certeza que acertei sempre em cada vida alheia que criei. E esta certeza resultou dum simples facto: nunca ninguém me veio contestar! Cresci com a certeza que "conhecia" qualquer desconhecido apenas pela forma de andar, roupa e expressões corporais. Com certeza que terei errado muitas vezes. Mas o facto de ninguém me ter vindo contradizer deu-me uma segurança imensurável que agora, tantos anos depois, dificilmente será abalada. Adiante...

À medida que fui crescendo, esteve "voyeurismo" foi sendo, contudo, naturalmente controlado e as arestas da minha curiosidade mórbida foram sendo limadas. Ninguém gosta de se sentir observado e a idade dá-nos mais aptidões sociais. Percebemos que não podemos ficar estarrecidos a analisar quem nos rodeia, simplesmente não é considerado "normal". Temos que nos manter ocupados com as nossas vidas, é feio olhar alguém mais que os três segundos socialmente aceites e é impensável ouvir descaradamente as conversas da mesa do lado. No entanto, se a idade me afastou daquela criança com tão fortes aspirações a socióloga, resta ainda um local em que o bichinho regressa. E esse local é... qualquer shopping em que entro.

Retomando o título deste post. Anos de aspirante a socióloga exercidos em shoppings permitiram-me verificar um fenómeno interessante que tem lugar entre os casais, de cada vez que pisam juntos escadas rolantes: a magia do amor. Sim, este nome piroso e digno de música do Tony Carreira é propositado. É que a magia do amor acontece mesmo. Sejam casais juntos há 2 dias, no auge da paixão, ou casais com 30 anos de união e tédio, o amor espreita sempre nas escadas rolantes. E é vê-los, casal após casal, a colocarem juntos o respetivo pé no primeiro degrau e, de seguida, a beijarem-se, a encostarem a cara um ao outro ou a abraçarem-se. Desconfio que as escadas rolantes são obra de algum Cupido que se decidiu tornar Engenheiro. Desconfio mesmo. As escadas rolantes têm magia. Por isso, se a vossa relação estiver a atravessar um momento menos mau, já sabem onde ir. Esqueçam as Maldivas, esqueçam uma lua-de-mel forçada ou qualquer destino paradisíaco. O amor acontece bem mais perto que isso. Acontece no Colombo, no Norteshopping, no shopping que estiver mais à mão. Metam-se num shopping. Tão simples quanto isso. E deixem-se levar pelo efeito-escada-rolante.


*Este post foi originalmente escrito a 28.11.2012. Foi, nada mais, nada menos, que o meu primeiro texto escrito aqui! No entanto, por algum erro que desconheço, não estava publicado. A propósito de uma conversa tida há dias sobre as escadas rolantes, decidi hoje ressuscita-lo, até porque mantém-se sempre atual. E que exercício estranho "ler-nos" passado algum tempo...

2 comentários:

  1. E é mesmo verdade...

    E já agora...Pippa, quando nos contas o que aconteceu em Cabo Verde? É que eu gostava de lá ir e fiquei curiosa.

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  2. Anónimo22:14

    ahah também já tinha reparado nisso :)

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