quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Quando (sor)rir não é o melhor remédio*

- Tens alguma alma gémea?
- Hmm... Defina alma gémea.
- Alguém com que te identifiques... Alguém que torne tudo mais claro para ti.
- Ah, sim, tenho muitas almas gémeas.
- Muitas? Então enumera algumas.
- Shakespeare, Nietzsche, Frost, O'Conner...
- Ah... isso é ótimo. Só que estão todos mortos.
- Não para mim. Para mim não estão mortos.

O diálogo é retirado, numa tradução muito muito livre, do filme "Good Will Hunting"/ "O Bom Rebelde", de 1997 (como é que o tempo passa tão rápido? ainda me lembro tão bem de quando vi o filme a primeira vez...). Ironicamente, Robbin Williams era o terapeuta que colocava estas perguntas ao inseguro, ainda que genial, Will Hunting, interpretado pelo Matt Damon. Ironicamente foi por este desempenho tão credível enquanto terapeuta/ pessoa equilibrada que ganhou o único Oscar da sua carreira, na categoria de melhor ator secundário. Ironicamente, a partir de anteontem, também ele entrou para a categoria de almas gémeas que não estão connosco. Sim, porque tenho a certeza que, para muitos, Robbin Williams simbolizava a alma gémea que gostariam de ter, simbolizava o homem emocionalmente equilibrado, divertido, bom ouvinte e inteligente que vimos neste filme e que gostaríamos de encontrar na vida real. Mas afinal seria mesmo?

O Bom Rebelde rapidamente se tornou um dos meus filmes preferidos. Adorei o Clube dos Poetas Mortos e vi-o vezes sem fim com as minhas amigas no liceu, mas O Bom Rebelde... O Bom Rebelde conseguiu marcar mais, talvez por ter visto já mais velha. Aquilo da mente brilhante para quem o reconhecimento dos outros é uma ilusão... A mente brilhante que tem medo de se apaixonar e continuar a sentir sozinha mesmo estando acompanhada... A mente brilhante que tem medo do próprio sucesso... Não sei bem porquê, mas talvez por ter visto o filme adolescente identifiquei-me um pouco com tudo aquilo. Em simultâneo, consolidei a ideia que tinha de que o Robbin Williams seria o amigo perfeito, o pai ideal, a companhia que qualquer um quereria para conversar num jantar, a pessoa a quem se ligaria num momento triste, para desabafar... Para mim ele era tudo isso. É horrível descobrir que, na verdade, se aproximava mais do Will Hunting que do próprio terapeuta. É horrível descobrir que, afinal, também ele seria inseguro e se sentiria sozinho, debaixo de tantos sorrisos. A morte é sempre ingrata e revolto-me muitas vezes com a morte de alguém, mas confesso que este caso me fez mais confusão por ser a morte de quem sorria tanto e acabou a suicidar-se com uma depressão. Faz-me confusão porque reforça a ideia que, afinal, o mundo não é preto e branco, não há os felizes e sorridentes dum lado, e os tristes e sisudos de outro. Há este vasto cinzento cheio daqueles que se escondem debaixo de tristes sorrisos. E como é que podemos ajudar estes? Como é que podemos ajudar alguém que não nos diz que precisa de ser ajudado...? E quantos estarão assim perto de nós...? Era tão mais fácil se, pelo menos quanto aos sorrisos, o mundo fosse realmente a preto e branco...

*Tinha este post terminado há dois dias, mas problemas com a internet não me tinha ainda permitido publicá-lo. Aqui vai, um pouco atrasado...

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