quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Oh não aconteceu mesmo!

Não tenho muita paciência para comédias. Pronto, já disse. Irritam-me aqueles momentos trôpegos, em que o protagonista se engasga, tropeça e cai. Irritam-me os desencontros, as confusões e as faltas de jeito. Sempre que estou a ver uma comédia com uma cena destas, apetece-me fechar os olhos com vergonha alheia ou simplesmente entrar rapidamente no ecrã e resgatar a vítima de tantos desastres. Além disso, aquilo parece-me sempre irreal, praticamente impossível de acontecer na realidade.

Hoje, no entanto, vi-me como a infeliz protagonista dum desses filmes. À hora do almoço tinha passado no Pingo Doce para comprar meia dúzia de coisas e lembrei-me de trazer uns pacotes de puré de fruta para bebé de que a minha nutricionista me falou. Por isso, quando vi que já eram 18h, peguei num dos purés de maçã e fui à copa para pegar numa colher e lanchar. Apetecia-me aquele momento de solidão, só eu e o silêncio. Quando cheguei à copa, no entanto, estavam lá alguns colegas e "big bosses" a passear e a petiscar também. Comecei a pensar "sento-me aqui com alguém numa boa, mesmo que estejam a ter conversas privadas? Sorrio, faço um ar confiante, mas pego na colher e vou-me embora comer à secretária? Ou armo-me em independentemente e sento-me sozinha?". Sim, sou envergonhada e não gosto de me impor, por isso, tenho sempre estas dúvidas nestes momentos. No meio desta indecisão, no entanto, peguei numa colher e decidi não pensar mais e juntar-me a alguém. Só que enquanto abria o pequeno pacotinho, virada para o balcão, um colega apareceu-me por trás e cumprimentou-me com um sonoro e inesperado "olaaaá!!". Talvez por estar embrenhada no meio das minhas indecisões e falsos problemas, assustei-me, abri mal o pacote e a comédia aconteceu: o puré explodiu, como uma garrafa de refrigerante que foi agitada, e fiquei cheia de maçã na cara, no cabelo e na roupa. Tentei manter-me de costas para toda a gente, a disfarçar e a limpar tudo discretamente, mas era impossível. Olhei para o meu colega como quem pede socorro e devo ter sido mesmo convincente, porque em menos de um piscar de olhos já ele me tinha trazido meia dúzia de guardanapos. Entretanto, não sei se foi impressão minha, mas a sala parecia mergulhada no mais profundo silêncio, enquanto apenas ouvia a voz dele, grave e mais alta que nunca: "ainda tens no cabelo. Aqui. Aqui na testa. Aqui no queixo. Aqui no casaco. Aqui no vestido. Tanta maçã! É melhor ires à casa-de-banho". Entretanto, um grupo talvez saído duma reunião, resolveu passar lá na copa. Parecia que toda a gente tinha ido lá para assistir ao meu desastre. Lá fui à casa-de-banho, com o rabinho entre as pernas, e enquanto me via ao espelho naquela triste figura, só tinha vontade de me fechar num cubículo da casa-de-banho e nunca mais sair dali, tamanha era a minha vergonha. Mas lá tive que voltar.
- Estava difícil!, disse-me o meu colega, mal me viu, com um sorriso, a tentar ser simpático, enquanto toda a copa esvaziava e me deixava sozinha. Que frustração. Tenho a certeza que sozinha nada daquilo acontecia. Porque é que é sempre assim?

Em segundos, já refeita e limpa dos mil pedaços de maçã, lá fiquei sozinha a lanchar o meu puré explosivo. E correu tudo bem, mas já não tinha plateia para o testemunhar. Pelos vistos, aquele público só tinha pago bilhete para a comédia. Haja alguém que aprecie...

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