quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Antes de ser oficial - a saga do segredo

Aquilo já estava a ser estranho. Sempre fui muito certinha, por isso quase uma semana já era assustador. Já não conseguia deixar de pensar nisso. Por isso, lá fui à farmácia e tentei parecer descontraída e casual. Para disfarçar, lembro-me que pedi outra coisa qualquer, para o teste parecer apenas mais um pedido entre tantos. “Olhe, queria um Benuron e… aii o período atrasou-se uns dias, estou a ficar preocupada. Não costuma acontecer, sabe? Mas agora como estou a ficar stressada, ainda é pior… Olhe… é também um teste de gravidez, por favor. Acho que não é nada, mas nunca se sabe”. E tentei sorrir de forma relaxada e ar confidente. Uma pessoa está sempre à espera que aquele momento pareça um filme e que a outra pessoa atrás do balcão nos diga “boa sorte!!” com ar feliz. Estamos à espera de ouvir música e passarinhos na nossa cabeça naquele momento. Mas só nos dizem “olhe, são…. euros. Vai pagar com dinheiro ou cartão? Quer que ponha o seu número de contribuinte?”. E dizemos “cartão... Sim, por favor”, como se naquele momento estivéssemos realmente preocupadíssimas com as deduções fiscais e com o IVA que estamos a suportar, claro. Não há um sorriso de orelha a orelha. Não há cá “depois venha cá dizer-me o resultado!!”, divertido. É o preço, senhores. O número de contribuinte. E um bom dia. Depois, fui com o saco na mão, meia envergonhada por ser transparente, e a tentar por o recibo e o Benuron por fora, para não se ver o “verdadeiro” conteúdo. Depois, foi o momento do xixi. Que momento triste. Ainda não inventaram uma forma mais bonita de uma mulher saber? Estar ali na sanita a fazer xixi e tentar acertar para um pauzinho não é bonito. É aquele momento que nunca é mostrado nos filmes. Nos filmes, a mulher entra na casa-se-banho a sorrir e sai depois com os dois risquinhos no ar, felicíssima. Na vida real, estamos preocupadas a tentar fazer tiro ao alvo. Não é bonito. Lavamos as mãos. Muito bem. Vestimo-nos. Tentamos retomar a compostura. E aguardar que algo apareça naquele pauzinho sem sal. Hei-de inventar um teste com música, para tornar o momento memorável. Cada pessoa escolhe a música com que quer celebrar o momento e a música começa a dar, enquanto a futura mãe dança, canta e salta, feliz. Dois tracinhos silenciosos, só, é demasiado insonso. Mas foi o que aconteceu. O momento dos dois risquinhos cor-de-rosa chegou, muito profissional, acompanhado pelo seu fiel livro de instruções e, com ele, todo um vendaval de emoções. Se me perguntassem há uns meses como achava que iria reagir a esse momento, diria, sem pestanejar: “vou gritar, saltar de alegria, contar a toda a gente, comprar logo mil e um presentes para o futuro bebé, pintar paredes com carneirinhos, comprar o berço e o carrinho. E gritar e saltar de alegria, já disse gritar e saltar de alegria?”. Não tinha dúvidas que aquele iria ser o momento mais feliz da minha vida. No entanto, quando chegou, tornei-me tão racional que nada foi como tinha imaginado. Dúvidas como “estarei mesmo? A X, a Y e a Z também estavam e depois a gravidez não avançou. O W também contou que ia ser pai e depois a mulher perdeu o bebé com dois meses. E o … E o …”. Naquele momento lembrei-me, sem exagero, de DEZ casos próximos em que me contaram a feliz notícia e que, pouco depois, sem que nada o fizesse prever, sofreram um aborto espontâneo. Dez casos próximos. Não é brincadeira nenhuma! Por isso, respirei fundo e mentalizei-me “pode não acontecer nada. É normal. Se avançar melhor, se não, estou bem na mesma”. Só quando fiz a ecografia, no dia seguinte, aquela ervilhinha no ecrã tornou tudo real. Materializou os mil pensamentos. De qualquer maneira, tentei não pensar demasiado no que estava a acontecer e fui fazendo a vida normal, ginásio e algumas corridas incluídas. A parte que me custou mais nesse processo de espera foi mentir às minhas amigas nos jantares (“estou a tomar antibiótico, não posso beber”) e encarar os meus pais e irmã sem lhes dizer nada, quando toda eu explodia com a notícia. A dada altura, tive a certeza que toda a gente sabia. Estávamos a sair dum jantar com amigos:
- Ela sabe! A R. sabe!
- Sabe como?
- Ela olhou-me para a barriga. Na despedida. Olhou-me nos olhos e depois desceu o olhar e parou na barriga. Parou na barriga. E depois voltou a olhar para mim. Ela sabe.
- Oh. Estás paranoica. Achas que toda a gente te olha para a barriga.
- Toda a gente não, mas ela olhou. Ela sabe!!


Não sabia. Perguntei-lhe mais tarde e garantiu-me que não sabia e nem se lembrava de alguma vez me ter observado a barriga. Depois, foi a minha mãe. Estávamos à mesa a conversar e, de repente, disse-me “quando estava grávida de ti, fiz a minha vida normal. Sempre. Dançava, namorava, foi a altura mais feliz da minha vida. Tenho fotografias em que estou de quatro meses, com uma saia justinha, a dançar, e acho que nem se via que estava grávida”. Senti-me ficar corada, mas continuei a fazer conversa. A minha irmã virou-se para mim “Estás muito interessada nestes assuntos. Estás grávida?”. Esta parte matou-me. Estar ali olhos nos olhos com as pessoas que me conhecem melhor, a ter que desviar o olhar como uma mentirosa… Deu-me um ataque de riso, de nervos. A mim e a ele. Ao chegar a casa, expus-lhe novamente as minhas certezas, só que desta vez também eram as dele:
- Eles sabem! Percebeste isso, não percebeste? Eles sabem.
- Pois sabem. E se não tinham a certeza, agora passaram a ter. Não disfarçámos nada. Foi péssimo.
- Pois foi. Que ataque de riso…
- Foi dos nervos. A tua irmã percebeu logo.

Não sabiam. Nem desconfiaram. Perguntámos mais tarde. A minha irmã disse-me depois que achou que estava a tocar num assunto sensível e por isso não insistiu mais.
Afinal, ninguém sabia. Ninguém me olhou para a barriga. Ninguém desconfiou os antibióticos e não poder beber álcool. Nada. Ninguém me leu no olhar “estou grávida”. A verdade é que, até ser oficial, sentimos que levamos connosco uma seta luminosa apontada para a barriga, mas afinal só nós a vemos. Mas ninguém vê. No fundo, é como quando temos uma espinha na cara e achamos que até aquele homem a cem metros, do outro lado da rua, está a olhar descaradamente para ela. É como quando não arranjamos as sobrancelhas e achamos que só olham para lá e que nos acham repugnante. Ninguém repara, na maior parte das vezes. Só nós, que estamos na nossa nova bolha gigante, que aumenta de dia para dia e parece prestes a rebentar. Só nós sabemos. E o resto do mundo, quando o dia chegar. Mas esse dia fica para o próximo post, para não vos maçar já com tudo.

10 comentários:

  1. Estava deliciada a ler, agora fiquei com o bichinho para saber o próximo episódio. Ja tinha fito mas repito. Muitas Felicidades *****

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  2. numa palavra: LINDO!!! ^.^

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  3. Anónimo15:25

    Parabéns .
    As maiores felicidades,

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  4. Anónimo16:31

    Muitos parabéns!
    Ângela

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  5. Anónimo17:52

    Fiquei com vontade, muita vontade, de estar também nesse estado de graça... o que é que nós tínhamos combinado? ahaha ;)) a descrição que fazes é deliciosa. E não, não reparei na tua barriga (mini-barriga) e quando me contaste só me apetecia apertar-te e eternizar o momento! Fiquei tão feliz como se fosses minha irmã... e és um bocadinho, tu sabes. Miss you!!! R. ****

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  6. Muitos parabens, mesmo sem te conhecer fico mesmo feliz por ti. Sigo o teu blog ha meses mas nunca comentei. Pareces ser uma pessoa cinco estrelas!

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  7. Anónimo16:25

    Parabéns! tb te leio desde o início e o que vens escrevendo de vez em quando deixou-me a pensar que estarias grávida sim, mas a fazer segredo. Por isso não notaram/desconfiaram aqueles que não te leram nas entrelinhas :)

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  8. Ahhhhhhhhhhh!! já não vinha aqui há algum tempo e que grandes novidades vejo! :D :D Que felicidade! Muitos parabéns! A cena do xixi e do teste de gravidez (e o resultado!) dão cá um friozinho no estômago... :) Mas a expectativa do que vem aí é uma coisa fantástica! Parabéns :)

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  9. Oh oh como me recorda as minhas duas vezes em que os dois pauzinhos surgiram. E guardei as ecos, que com o tempo se esbaterão mas não consigo deitá-las fora. Montes e montes e imensos e quilos de felicidade e parabéns e sorte e paciência. :)

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  10. Oh... que giro! Parabéns!!Tive o meu primeiro bebé há 10 meses e posso garantir-te que as emoções que sentes agora e que vão crescendo ao longo da gravidez são um grão de areia comparadas com o que aí vem. É mesmo um lugar comum, mas não tenhas dúvida de que é a maior alegria da vida! A chegada de Baby Caco qfoi uma das razões que me levou a criar o blogue.Parabéns!!!! :-)

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