quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Tenho uma nova leitora muito especial

A minha mãe saiu-se ontem com uma frase que me intimidou um pouco “tenho-te lido”. “Tens o quê?”. “Tenho lido o teu blog. Ando a ler os teus textos”. Naquele momento, ia sozinha na rua, mas acho que corei e acelerei o batimento cardíaco. Quando criei o blog contei aos meus pais que tinha um novo “hobby”, mas nunca pensei que começassem a ler, porque não são muito frequentadores da internet. Quando escrevi textos dedicados a eles, nos anos deles, imprimi os textos e dei-lhes, pois sabia que, de outra forma, nunca os iriam ler. E sempre que escrevi aqui, escrevi a sentir-me 100% livre, sempre que falei neles, falei porque me apetecia muito, não porque pensei que iriam estar a ler. Ontem, no entanto, fiquei envergonhada. E porquê? Porque, em última análise, é aos pais que queremos agradar. E não sei muito bem o que hão-de pensar ao ver-me divagar sobre futilidades ou disparates, como muitas vezes acontece. Senti-me como sentia quando entregava uma composição ao Professor de Português – adorava o meu Professor de Português, era o meu ídolo e uma inspiração, mesmo sendo tão exigente e perfeccionista – e ficava ali a vê-lo ler, a franzir os olhos, durante minutos que, naquela espera, me pareciam intermináveis. Naquele momento, tal como acontece agora sempre que entrego qualquer trabalho, sentia que tinha feito a maior porcaria do mundo, questionava tudo, sentia-me mínima perante a grandeza do meu “revisor”. Ontem aconteceu o mesmo, enquanto a minha mãe me revelava a sua nova fonte de leitora – senti-me pequenina e ridícula.
- Mas sabes uma coisa? Gostei muito. São textos muito bem escritos, mas ao mesmo tempo com uma linguagem muito descontraída. O blog és mesmo tu. Escreves como és.

Não me comparou a Camões (como há tempos um colega meu dos tempos do secundário disse que foi comparado). Não disse nada que me coloque na linha de candidatos ao Nobel. Não disse nada que deva ser bordado numa tela e colocado à entrada de minha casa. Mas, para mim, deu-me o maior elogio do mundo: gostou. E isso foi o melhor que podia ter dito. Ainda bem que gostaste. Sabes perfeitamente que foste tu que me incutiste o gosto pela leitura, ao ler-me primeiro, todas as noites, noite após noite, sem te cansares. Ao incentivar-me depois a ler os autores clássicos portugueses – “foi com eles que cresci”, disseste-me –, fosse Eça de Queirós, fosse o Camilo Castelo Branco, fosse o Almeida Garrett, fosse o Júlio Dinis. Ao comprar-me livros, tantas vezes. Ao levar-me contigo para o trabalho, quando estava de férias, e deixar-me usar a máquina de escrever, naquele gabinete só meu, toda a tarde. “Escreve o que quiseres, podes usar essas folhas todas”. Foste tu que discutiste Gramática comigo e me puxaste a pesquisar porque é que se devia ler “m(e)nistro” e não “ministro”. “Anciões” ou “anciães”? Para ti, o português sempre foi um desafio e não um dado adquirido. E foi também por tudo isso que este elogio me soube tãaaaao bem.

3 comentários:

  1. Todos os leitores são especiais, mas os familiares são sempre mais. Adorei o texto!

    nadinhadeimportante.blogspot.pt

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  2. Olá mãe da Pipa. Eu gosto de ler a sua filha.

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  3. Que giro. Tens uma leitora muito especial! :D

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